Recente, estava lendo sobre uma tal pesquisa (lá no país de sempre - Estados Unidos), dizia que pais que batem nos filhos para fins de educação, garantem melhor qualidade de vida, se tornam mais educados, melhor nota na escola, se realizam, etc.
Mas o que quero falar aqui não é sobre essas pesquisas de revistinhas digitais da virtualidade. Mas os comentários sobre essa questão chamada "Lei da Palmada".
Vejam bem, não é sobre a Lei em si, mas os comentários habituais que se costumam fazer quando se fala sobre essa Lei.
Vou deixar aqui um exemplo dos mais comuns:
Exemplo 1:
Eu acho que tem que bater sim, APANHEI QUANDO ERA CRIANÇA E HOJE SOU UMA PESSOA BEM EDUCADA, e agradeço a minha mãe por ter batido em mim, pois fez ser quem sou hoje. Mas eu apanhei, não fui espancada. Isso é completamente diferente.
Exemplo 2:
Meus pais NUNCA ME BATERAM, eu tinha melhores notas da turma, e meu otimismo é desde berço!
Exemplo 3:
Se for preciso tem que bater sim, APANHEI DA MINHA MÃE e estou aqui vivo e sabendo o que é CERTO DE VERDADE.
Exemplo 4:
Lá vem as pessoas falarem que bater é errado e blá, blá, blá. Só pra deixar bem claro, eu roubei um brinquedo quando eu era pequena, mas depois que minha mãe me deu uma palmada nunca mais roubei. AINDA BEM QUE EU APNHEI!
Exemplo 5:
Eu apanhei quando era criança e SÓ TENHO RAIVA DOS MEUS PAIS por causa disso. Eu fazia travessuras de criança. Apanhava de mangueirada por causa disso. Hoje sou advogada e bem realizada, agradecer a eles por quem eu sou? Jamais!
Exemplo 6:
Eu nunca apanhei de meu pai, eu ACHO QUE POR ISSO, às vezes, ME SAIO MAL EM ALGUMAS PROVAS.
Bom, esses seis exemplos é só para ilustrar que você encontra uma diversidade de opiniões, contra e a favor de bater como forma de educar. Alguns ainda apontam a diferença entre bater é uma coisa e espancar é outra. E usam isso como forma de diferenciar as coisas.
Mas há algo nesses exemplos que me chama mais atenção. É até absurdo, mas é o fato de que as pessoas realmente relacionam o fator "bater" como decisivos em suas vidas.
Uns dizem (exemplo 1, 3 e 4) "apanhei quando era criança e hoje sou uma pessoa bem educada". Ou seja, há pessoas que colocam o castigo (apanhar) como crucial para hoje serem uma boa pessoa e educada. Essas pessoas colocam suas experiências pessoais como fator determinante para aceitar que apanhar pode ser bom.
No exemplo 2, há pessoas que "nunca apanharam" e mesmo assim tiveram boa educação. O Mesmo fator crucial em relação a apanhar, no caso, de "não apanhar" fez essa diferença na vida dessas pessoas. Ou seja, consideram desnecessário apanhar.
No exemplo 5, apanhar causou claramente uma revolta e um trauma, onde a pessoa relaciona sua conquista e realização pessoal pelo seu próprio esforço. Desconsiderando os pais e alimentando seu ódio por um dia ter apanhado quando criança. Nesse exemplo, ocorre o oposto dos exemplos 1, 3 e 4. Ou seja, aqui, apanhar pode ser ruim.
E no exemplo 6, a pessoa faz uma relação que nunca apanhou e por isso não é tão bom nos estudos. Relaciona que isso fez falta na sua vida. Ou seja, apesar de ser um exemplo peculiar, a pessoa embora não tenha apanhado, sua opinião é semelhante ao exemplo 1, 3 e 4, assim apanhar pode ser bom.
Agora vem a parte subjetiva do que quero dizer com tudo isso. E começo dizendo que estão todos cometendo UM GRANDE EQUÍVOCO.
Isso mesmo, não se trata de apanhar ou não apanhar. De apanhar e espancar serem coisas diferentes. De apanhar "ajudou a ser uma pessoa melhor ou pior". De apanhar "fez você ser pior e sentir ódio ou ter ficado traumatizado". A questão nada tem a ver com apanhar e seus resultados positivos ou negativos, ou mesmo irrelevantes. A questão é, na verdade, uma subjetividade chamada "TRANSMITIR A MENSAGEM".
Isso é meio complicado, mas é preciso ser subjetivo para compreender.
A Lei da Palmada veio de forma muito abrupta (sem considerar muitos pontos) e nossa cultura, principalmente, é muito preto no branco, é ou não é, vermelho ou azul, 8 ou 80, etc. E sempre desconsidera mil e uma possibilidades, limitando-se a ver apenas aquilo que se apresenta "visível" no momento.
Acredito que o mais importante é que se passe uma mensagem.
Um exemplo legal está naqueles programas do tipo "Super Nanny", é muito comum a seguinte cena:
- Ela ensina como deve punir o comportamento do filho (através de um castigo, que não envolve bater), ensina que ele deve ficar de castigo e que no fim do castigo peça desculpas pelo que fez (conscientizando a criança do motivo pelo qual foi castigada). Em seguida, os pais vão tentar fazer o que foi ensinado, o pai ou a mãe, vai até o lugar onde o filho ficou de castigo para retirar ele desse castigo e dizer para ele pedir desculpas pelo que fez. A criança, naturalmente, mostra resistência, os pais se irritam e dizem algo como: "anda logo que eu tenho que sair" ou "eu tenho mais o que fazer". Nesse momento, Super Nanny é quem corrige os pais e diz: "Não é assim, vocês estão fazendo errado. Se você diz para o seu filho pedir desculpas porque você tem que sair, então ele vai aprender que está pedindo desculpa não pelo que fez de errado, mas porque você está com pressa (irritado, etc.)".
Ou seja, a mensagem não está sendo transmitida de forma correta.
Isso acontece no dia a dia. Quantas vezes uma palmada é dada porque na verdade os pais estão apenas irritados com a resistência e persistência dos filhos?
Portanto, essa "palmada" não tem objetivo nenhum, não ensina nada, não transmite nada. Não só a palmada, mas o simples castigo de ficar no cantinho, de ficar no quarto, de ficar sem brincar, etc. Tudo precisa ser feito, mas precisa também transmitir uma mensagem e da maneira correta.
Então, quando vejo os discursos das pessoas comentando sobre a Lei da Palmada e se justificando sobre ser positivo ou negativo apanhar. Elas pensam apenas que:
(1) apanhar é bom, porque eu apanhei e hoje sou uma pessoa de bem;
(2) apanhar é bom, porque nunca apanhei e por isso nunca fui bem na escola (por exemplo), ou seja, se tivesse apanhado talvez tivesse ido melhor na escola;
(3) apanhar é ruim, porque apanhei e ia mal na escola do mesmo jeito (por exemplo);
(4) apanhar é ruim, apanhei e hoje tenho raiva/ódio dos meus pais.
Esses exemplos resumem a relação que fazem sobre apanhar ou não apanhar. E na verdade, não tem a ver com apanhar ou não, mas sim com transmitir a mensagem à criança.
Em outras palavras, tanto quem apanhou quanto quem não apanhou e obtiveram ganhos positivos, esses "ganhos" se devem da mensagem que foi transmitida com êxito na educação que receberam de seus pais. Assim, não importa que método seus pais utilizaram, se foi "o cantinho do castigo" (reflexão), se foi "ficar sem brincar", se foi "ir para seu quarto", se foi uma surra ou uma simples palmada, ou se foi um grande sermão. O mais importante foi que a mensagem foi transmitida antes, durante ou depois do método utilizado.
Se uma criança apanha ou é castigada e não sabe por que está ali ou até sabe, mas mensagem nenhuma é transmitida. Certamente o castigo não resultará em nada. Podemos dizer que no exemplo 5, a pessoa diz claramente, na lembrança dela, que apanhava porque fazia travessuras de criança. Entende, portanto, que embora travessuras possam ser irritantes, não justifica levar uma surra. Ou seja, apanhou por apanhar. Nenhuma mensagem foi transmitida nesse exemplo.
Da mesma forma, aqueles que apanharam ou não e no fim não consideram que tiveram “ganhos positivos”, essa falta de "ganhos", implica que apesar da presença ou ausência de castigos, mensagem nenhuma conseguiu atingir a criança em questão.
Se você é alguém que está lendo esse texto agora e um dia, talvez na sua adolescência ou só quando adulto, é que foi "se tocar" de como você era um "diabinho". Deves reconhecer que nada do que era feito (surras e mais surras, castigos e mais castigos), não alcançavam o seu entendimento para a importância da questão. Ou mesmo que entendesse de forma rasa, que se fizer algo que seus pais consideravam errada seria motivo de apanhar. Assim, muitas crianças na verdade vivem com medo de seus pais. Mostravam-se educados e disciplinados, não porque aprenderam esses valores, mas porque aprenderam a usar isso como estratégia para não apanharem. Percebem a diferença? Acredito que sim.
Se você é alguém que está lendo esse texto agora e depois de ter apanhado ou ter sido castigado num cantinho, ou ainda ter tido "aquela conversa" com seus pais. Lembre-se que nesses momentos algo atingiu sua percepção e isso é que fez o efeito positivo que você considera hoje fundamental em sua vida. Não foi a surra em si, não foi o sermão e nem foi o cantinho da reflexão, mas sim a mensagem que alcançou você. Muitas vezes essa "mensagem" que tanto falo aqui é fruto de um relacionamento entre pais e filhos que possuem diálogos cujo objetivo é entender o que se passa, compreender dificuldades, enfatizar coisas que se considera importante. Tanto pais que batem quanto pais que não batem, mas conseguem estabelecer um relacionamento onde é possível transmitir essa mensagem, conseguem com mais êxito um melhor resultado na educação da criança.
Se você é pai ou mãe e está lendo esse texto agora, tenha em mente isso: não importa o método que você use (desde que não humilhe e não espanque a criança), mas mesmo que sejam umas palmadas, lembre-se de que o castigo, seja qual for, deve conter um significado, uma mensagem. E, o mais importante, não se esqueça de se certificar se o que você usou como método para educar seu filho ou lhe ensinar algo que considera importante, realmente atingiu a compreensão dele.
Lembre-se que a criança ainda não possui o mesmo intelecto amadurecido de um adulto. Uma mensagem que é clara na sua mente pode ser "um bicho de sete cabeças" na mente de uma criança.