No princípio, enquanto esse, no convívio superficial, se apresentar como satisfatório às próprias concepções fantasiosas, por hora, acalentará suas carências emocionais, mas, logo, ao ser explorado dentro da sua realidade, onde guarda uma ideia diferente àquela que se limitou a criar... Tornará nada mais que um conto de fadas corrompido. Por conseguinte, no auge da imaturidade, passará a buscar outro objeto a fim de que finalmente se enquadre no seu admirável mundo de faz-de-conta. (Santiago Gomes)
Idealização
Além de simplesmente definir como um ato/efeito de idealizar-se, considerasse o processo psíquico pelo qual o objeto de amor é engrandecido até a perfeição. O que ocorre é que o objeto idealizado passa pelo processo de tornar-se ideal, para aquele que o idealiza, projetando no mesmo a fantasia de busca por desejo e satisfação em si.
É quando a pessoa, ao idealizar, exagera, de forma positiva, as virtudes de outra pessoa. Mesmo que para isso seja necessário tirar valor dos demais.
Uma das características da pessoa que idealiza desta forma é o sentir-se inferior, fazendo-se crer que o outro, objeto de idealização, trata-se de alguém inatingível, um modelo a ser seguido e venerado.
Claro que existem muitas formas de idealizar: no amor, na família, nos amigos, no ídolo famoso, no trabalho, na vida, no status social, etc.
Geralmente, no entanto, é na paixão que esse momento costuma ser mais claro. Facilmente detectamos na presença da idealização a paixão de uma pessoa por outra (a outra nem sempre com o mesmo, digamos, "nível" de reciprocidade). A pessoa apaixonada está sob domínio de um estado emocional em que supervaloriza a outra em praticamente (ou em todos) os seus atributos. Cega-se para os defeitos.
A idealização ainda pode ser vista na infância, como a relação entre mãe e filho, em que a mãe não consegue enxergar defeitos na própria criança.
Um exemplo interessante (e de uma idealização até saudável) é a história real de uma mãe que antes de engravidar tinha medo de ter filho com alguma doença ou defeito (genético) e, principalmente, com síndrome de down. E foi justamente o que aconteceu. O pai era médico e quando viu a criança reconheceu logo, pois todos sabem que as características dos que tem down são visíveis aos olhos e se preparou para o impacto da mãe ao ver a criança. No entanto, para sua surpresa a mãe nada disse, achou linda e perfeita como era de se esperar de toda mãe, mas logo ele percebeu que se tratava do coração de mãe em ver apenas o perfeito de uma filha.
Ignorou, portanto, as orelhinhas que ficam numa posição um pouco mais baixa na cabeça, os olhos mais oblíquos e puxadinhos para cima, as pálpebras com uma dobra na pele a mais, a flacidez da pele (principalmente na região do pescoço), entre outras características. Inclui também a ignorância ao perceber que sua filha demorava um pouco mais para aprender as coisas e, passados uns meses, o pai não aguentou e contou a esposa. Ela ainda relutou por algum tempo, pesquisou e pesquisou como quem tenta encontrar uma (única) prova contrária para fazer-se crer que não podia ser verdade.
Claro que depois, não teve mais como esconder e a mãe aceitou a filha e a continuou amando (inclusive é uma história muito bonita).
Voltando ao perigo da idealização.
Pois sim, isto pode ser mesmo perigoso e para ilustrar temos os relacionamentos. Aquelas pessoas que estão machucadas pelo amor provavelmente possuem alguma tendência para idealizações, pois costumam fechar os olhos para a realidade e enxergam somente o que querem, ficando num ponto de extremismo completo: ou fulano presta ou fulano não presta. Jamais considerando que uma pessoa que tem defeitos também tem suas qualidades e vice-versa.
Então, esta pessoa, um dia machucada pelo amor, conhece um novo candidato e não se segura. Faz planos, imagina-se viajando, fazendo compras juntos, apresentando e conhecendo família e todo tipo de cenário que podem e não podem acontecer do jeito que se imagina. Sem se dar conta vai, lentamente, se aprisionando na fantasia criada antes desses acontecimentos realmente acontecerem. Pintando em seu quadro imaginativo um ser ideal.
Daí o tempo vai passando, as coisas acontecendo, mas a pessoa vai insistindo que tudo é maravilhoso. Até pode dar o braço a torcer para um defeitinho aqui, outro ali, mas no geral é tudo colorido e perfeito. E quando a relação chega num ponto crucial, o outro, já não aguentando e (às vezes) até fazendo proveito da situação de "submissão" revela todas as suas garras, mostra tudo o que tem de pior. Mesmo assim, a aceitação "incondicional" continua a gritar mais alto. É como se a pessoa dissesse para ela mesma: "vai passar, isso foi só um momento de estresse e cansaço".
A pessoa só sai desse "encantamento" quando, finalmente, a relação termina. E é nesse momento que o lindo se torna o feio. Aí acontece o feito contrário, na mesma proporção que imaginou o príncipe encantado, agora imagina o demônio em pessoa.
Então, será que o outro era um santo?
Certo de que não se tratava de nenhum santo.
Mas será que era um monstro?
Provavelmente não. E possivelmente era apenas uma pessoa comum, com qualidades, com defeitos, que se irrita, alegra-se, que acerta, que erra, que pode se dar bem com pessoa "X", mas pode não se dar bem com pessoa "Y", e todos nós somos um pouco assim.
Pessoas com baixo autoestima costumam entrar nesse universo fantasioso, porque isso os alimenta, os faz acreditar que encontraram a salvação para suas vidas chatas e sem graça. Apenas lembre-se: a única real “salvação para sua vida” é cuidar de si, se proteger, se valorizar, manter sua confiança, viver em pé de igualdade com o outro. O relacionamento saudável nada tem a ver com o outro ser fantástico e você um “zé ninguém”, um relacionamento não funciona assim. Você é alguém, o outro é alguém, ninguém é mais importante. Você tem suas qualidades e defeitos e o outro também. Se seu relacionamento não caminha nessas linhas, tenha certeza, não acabará bem.