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Muzak Ayala

Traição! Devemos perdoar?


Este texto é uma resposta muito comum a um frase muito repetida por usuários em redes sociais, eis a frase:

"Se eu perdoaria uma traição? Claro que não! Erros podem ser perdoados e traição não é um erro, é uma escolha!"

Agora vamos pensar sobre isto:

O que mais dói na traição é que fere nosso ego. Nós pintamos de outras formas claro: nós nos dizemos revoltados, decepcionados, magoados, ofendidos, humilhados, desconsiderados, desprezados, etc. Mas na verdade o que dói mesmo não é a decepção, a mágoa, a ofensa, a humilhação, etc., o que dói mesmo é o nosso ego. É claro que existe algum sentimento "lá dentro", não vamos ignorar tudo de forma tão literal assim, mas o nosso ego está se contorcendo sem parar.

Se olharmos então para todas essas palavras que dizemos a nós mesmo (e fazemos questão de dizer a outros para que todos saibam como nos sentimos), chegamos uma fácil conclusão: somos muito dramáticos, exagerados e egocêntricos. Afinal, não é atoa que fazemos questão de dizer "eu fui traído", é quase um atestado, assinado por nós mesmos, para afirmar que o errado é o outro e fim de história. Nos santificamos no fim desses discursos, mas não admitimos esse detalhe, por quê? Ah, só um detalhe, não é mesmo?

A verdade é que todos os dias pessoas traem e são traídas (e não falo só de traições amorosas, existem amigos que traem amigos, às vezes traímos nossos pais com nossos amigos, às vezes traímos nossos irmãos com pessoas que achamos que são as melhores e tão melhores que quando todo o prestígio acaba essas pessoas desaparecem, enfim). E a boa verdade é que somente quando nos acontece é que decidimos chutar o pau da barraca. Mas quando acontece com outros, nós tratamos com um simples "vai passar". Então, quando digo que somos muito dramáticos, ao comparar como tratamos quando é conosco e quando é com outros, dá para ver que somos mesmo dramáticos. Ora, por que com os outros dizemos um simples "vai passar" e conosco agimos como se fosse o fim do mundo? É porque quando ocorre com o outro o nosso ego está intacto, está salvo, mas quando ocorre conosco, nosso ego está quebrado e dói (é isso que realmente dói).

E se traição for uma escolha? Sim, é uma escolha, e é uma escolha errada (logo também é um erro). Veja, perceba, nosso ego é tão prepotente que reproduzimos uma frase e não nos tocamos o erro que a mesma comete. Considere mais uma vez a frase:

"Se eu perdoaria uma traição? Claro que não! Erros podem ser perdoados e traição não é um erro, é uma escolha!"

Agora pensemos: Se partirmos do princípio que tudo, e eu disse TUDO, é uma escolha que fazemos, seja tal escolha consciente ou inconsciente (nesse caso ela provem de situações anteriores que decidimos muito antes de acontecer, como por exemplo o nosso posicionamento sobre uma determinada questão vai determinar, em dias futuros, se vamos aceitar algo - se o posicionamento for a favor - ou se vamos recusar - se o posicionamento for contra, mesmo que na hora não nos damos conta disso). Mas se tudo o que fazemos é uma decisão (cada escolha, uma renuncia e cada renuncia, uma escolha), então trair foi uma escolha do indivíduo. A frase diz que erros podem ser perdoados e eu questiono: ora, pois, escolhas também estão sujeitas a escolhas certas e escolhas erradas, não seria a escolha "trair" uma escolha errada? Se você tem um cérebro, use-o e pense: trair é uma escolha errada e erros podem ser perdoados, lembra dessa parte da frase?

Então, aquela frase que iniciei este texto diz "traição não é um erro, é uma escolha" está completamente equivocada. Traição é um erro resultado de uma péssima escolha, isto é, trair é as duas coisas: é um erro e é uma escolha e esses dois fatores estão relacionados de forma impossível de serem separados.

E para superar isso e compreender da melhor forma possível, é preciso que você (isso mesmo, você que está lendo isso agora), cultive um espírito rico.

Não sejamos, portanto, pobres de espírito, pelo contrário, sejamos sempre RICOS DE ESPÍRITO, cultivar isso (um espírito rico) é a coisa MAIS IMPORTANTE DESSE MUNDO.

O pobre de espírito é aquela pessoa cujo estereótipo, cuja imagem da pessoa é: pobre, humilde e trabalhadora. E isto não poderia estar mais equivocado, pois basta que alguém cometa uma injustiça com esta pessoa, daí ela se transforma. Sim, se transforma, pois se vê cercada de razão, a "verdade" (entre aspas) está do seu lado agora, todos os pontos "estão ao seu favor". Aí o que essa pessoa faz? Demonstra o quanto é humilde? Não, pois ela não é humilde de verdade, ela é apenas alguém com esteriótipo de humildade. Somente os ricos de espírito é que conseguem demonstrar sua humildade, mas esta pessoa aqui (neste exemplo) é pobre de espírito, então o que ela faz é isto: No auge da "razão" ela joga toda a sua arrogância para cima do ser que lhe cometeu o erro. O massacra se tiver a oportunidade. E isto não é humildade e nunca será.

OBS: "matar" a pessoa aos poucos é o mesmo que massacrá-la, na verdade é até pior. Como todo bom ser humano, temos muito de egocentrismo em nossa alma e temos conhecimento que entre as piores coisas do mundo é se sentir ignorado e sabemos que muitas pessoas usam desse recurso, sem pestanejar, para "vingar-se" do outro. E afirmo em verdade, é um golpe muito baixo. Sejamos ricos de espírito e não pobres, sejamos verdadeiramente humildes e não estereotipados (e não estereotipados com uma falsa humildade, aquela que todos chamam de "pobre, humilde e trabalhador", pois isto é falso, não é a verdadeira humildade e nunca será).

Ser humilde não é ser idiota e nem bonzinho o tempo todo, mas também não é porque você está na razão que vai e/ou precisa se aproveitar disso para massacrar o outro e mostrar o quanto ele está errado.

Ser humilde é ser firme em suas atitudes, seguro em suas ações, honesto consigo mesmo, bondoso para com os outros e respeitado pela sua riqueza (verdadeira) de espírito. Aquela pessoa que conhecemos e admiramos, não por ser famoso, não por realizar atos de bravura, não por dar dinheiro aos pobres, não por ser generoso com todos; mas porque o vemos no poder, o vemos com a decisão de julgar e apontar dedos, o vemos com a palavra final e, no entanto, eis que nos surpreendemos e muitas vezes não compreendemos. Uma vez que estava na razão, uma vez que estava certo, uma vez que a verdade estava ao seu lado, por que não fez uso do seu poder? E por que não condenou, já que julgaria certo, pois a verdade estava do seu lado? E por que não usou a palavra final?

Ao invés disso relevou, apostou de novo na pessoa (e não foi a primeira e nem a centésima vez, mas talvez a milésima, não importa); o que nos surpreendeu e (por vezes) não compreendemos, é que o rico de espírito viu a pessoa não como maldito (desgraçado, traidor, desonesto, malandro, safado, etc - mesmo que a pessoa seja mesmo tudo isso, não é o que importa aqui), mas como um infeliz que fez o que fez por ser pobre de espírito. O que nos surpreendeu foi que esta pessoa, realmente humilde, com todo o poder que tinha "abraçou" o fraco espírito da pessoa, invés de se aproveitar e lhe destruir, "segurou em suas mãos e o levantou".

O ser humano, cujo espírito é rico, compreende que o espírito alheio, por ainda ser pobre, sempre cometerá novos erros.

A questão é: o que tens feito para enriquecer o espírito alheio? Tens humilhado o outro? Tens jogado as "verdades" em sua cara? Tudo isso não passam de sentimentos baratos, não ajuda a enriquecer o espírito pobre do ser humano e ainda faz tornar o seu tão sujo quanto.

Cultivai um espírito rico e assim enriquecerá os espíritos daquelas pessoas que te rodeiam. Traições e erros cometidos serão apenas lembranças de uma época em que eramos profanos, mas que hoje (amanhã que seja) não precisamos mais ser.

Sobre traição: perdoar uma traição significa compreender em que estado de espírito você se encontra e em que estado de espírito se encontra aqueles que lhe traíram. Todos nós cometemos erros e sempre desejamos que nos perdoem por piores que sejam nossos erros. Alguns de nós somos ainda tão covardes que quando alguém nos diz: "você não perdoa o outro pelo erro que ele cometeu, mas e SE FOSSE com você, não iria gostar de ter o perdão?", veja somos tão covardes que quando alguém sugere uma simples reflexão como "se fosse você", sabe o que fazemos? Damos uma resposta escapista (uma resposta de covarde) e dizemos: "ah eu não, porque nunca traí ninguém". Veja que a pessoa não está dizendo que você traiu, ela está lhe convidando para uma reflexão "SE FOSSE" e nós somos incapazes até de ousar fazer essa reflexão. Que injusto somos, quão pobre ainda é nossos espíritos. Temos medo até de fazer uma simples reflexão.

No entanto, sempre somos imaturos quando o erro não é o nosso, mas o do outro. E por quê? É porque somos pobres de espírito, somos profanos, temos medo e a traição fere nosso ego, então procuramos vingança, desejamos mal o outro que outrora dizíamos amar, torcemos para que se dê mal de alguma forma isso nos faria sentir bem (bem com a maldade que acontece a outro - deveríamos ter vergonha desses pensamentos podres). Ora, reflita se isso não é fruto de um coração pobre, sujo e egoísta?

Então, devemos perdoar uma traição?

Responda o que tem dentro do seu coração, pois o que saí de nossas bocas é que cultivamos no coração.

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Este texto foi escrito ao som de uma música que é de um desenho chamado Cowboy Bebop, música é Gotta Knock A Little Harder. De forma resumida: o desenho tem como tema uma ilusão, onde a pessoa acudida desta ilusão enxerga borboletas em forma de luzes e, como é o único que pode vê-las, deseja que outras pessoas também as vejam, porém é uma doença, mas mesmo assim está disposto a contaminar o mundo todo só para provar que as borboletas de luzes existem no auge do seu egoísmo.

Todos nós vemos nossas próprias borboletas de luzes que ninguém mais consegue ver, faz parte da nossa insegurança e é fruto da nossa própria insanidade (que é natural de todo ser humano, como dizem: de louco todos temos um pouco... e isso é tão humano quanto a frase "errar é humano").

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